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Blog do Mauro Beting

Cobranças de lateral e cobranças paralelas. Jornalismo, futebol e paixão

Mauro Beting

26/09/2016 11h32

O Mauro que mais aprecio no jornalista esportivo é o Mauro Pinheiro, o senador que era grande e elegante comentarista, excelente pesquisador e historiador do futebol. Mauro Naves é outro grande parceiro e amigo e senhor repórter. Mauro Júnior é outro baita tudo isso. Como Mauro Cézar Pereira, dos mais respeitáveis, sérios (até demais), competentes e completos jornalistas esportivos do Brasil. Conheço o xará desde 2000. Gosto dele desde então. Discordo muito, como discordo demais do Mauro Beting jornalista. Eu, como meus filhos, corneto demais o comentarista que é pai deles. Faz parte.

Temos muitos amigos em comum, MB e MCP. Ele tem muitos desafetos que são meus amigos. Tínhamos até junho um amigo queridíssimo em comum, Daniel Barud, que meu xará tanto ajudou. É do coração do Mauro. Sim, alguns acham que ele não tem, que é duro demais, exigente demais, quer as coisas sempre muito certas. O que jamais será defeito. É questão de jeito, de estilo. É característica – e, diga-se, das mais louváveis e corajosas em país tão injusto e errado como o nosso.  Aprecio demais esse jeito dele. Mas sou diferente. Eu sou mais, digamos, complacente, mais na minha, um tanto mais aberto ao diálogo que o xará que é das Organizações Bloque. Não a Bloch da falida Manchete, mas a de bloquear nas redes sociais quem ele não quer papo. Com ou sem motivos. Outro cracaço como o Flávio Gomes é assim. Jeito de dois caras que admiro demais como pessoas e como jornalistas.

Sou diferente. Prefiro seguir quem "merece" bloqueio. Prefiro conversar e/ou sacanear quem chega chutando. Não é defeito ou virtude minha. É característica. Mas acho, também, que como jornalista, preciso aturar, entender, compreender e respeitar a corneta, a crítica, a cobrança lateral, a paralela, a direta, a sacanagem, a trollada, a stalkeada e a detonada do público do mesmo jeito que o jornalista faz isso desde que começou. Mas, infelizmente, muitos queridos colegas já partem para o bloqueio direto. Honestamente, não entendo. José Kalil, outro amigo que prezo e que adoro como jornalista mesmo não concordando muitas vezes com ele, também segue pelo mesmo caminho. Tenho outra rota. Mas quem diz qual é a certa?

O ideal é o equilíbrio. Sempre. Para o jornalista chega a ser dever subir no muro para ver os dois lados. Buscar a melhor versão possível dos fatos. Entender as vários cores e credos. Buscar a maior imparcialidade, isenção e independência possíveis. O ideal seria alguém por vezes tão ácido, azedo, crítico e exigente quanto o Maurão (quase um Garoto Enxaqueca) mixado com este Mauro (quase um Guga) por vezes tão doce, complacente, "romântico", amigão, bonzinho e palhaço.

Talvez por isso o MCP enxergue tantas coisas ruins no Palmeiras que já foi melhor no BR-16. Talvez por isso o MB enxergue quase as mesmas coisas mas de um modo menos duro. Questão de gosto e de estilo. Segue o jogo. E ele pode seguir erguendo bolas na área rival nas cobranças laterais do ótimo Moisés sem que seja crime lesa-bola, lesa-pátria, lesa-paixão, lesa-legado. Como também pode seguir o mesmo Palmeiras que tem alternativas técnicas e táticas, já jogou melhor e mais bonito no BR-16. E quase tão bem quanto tem jogado o Flamengo, hoje dono do melhor futebol do Brasil. Da melhor sequência de desempenho e resultados (também contra rivais menos complicados que os enfrentados pelo Palmeiras).

Também nisso concordamos. A questão, insisto, é que MCP é mais exigente que MB. É mais contundente. Se você quiser analisar que muitas das críticas e elogios dos Mauros se devem às cores dos corações de ambos, você tem todo o direito. Somos assumidamente torcedores. E por isso mesmo somos assumidamente jornalistas. Só pode trabalhar com futebol quem torce por um time. Quem não torce não entende o torcedor e, por tabela, o futebol. Quem segue torcendo por uma paixão incondicional entende mais o próprio time e o dos outros. Quem esconde o time esconde o ouro e o chumbo. Quem deixa de torcer deixa de entender o espirito. Quem troca de time, então…

MCP cobra demais o tal Cucabol pelos laterais cobrados dentro da área… Se eu fosse treinador e descobrisse o lateral que Moisés joga lá na muvuca (e que o bicampeão mundial Djalma Santos também jogava muitas vezes na área rival na Era de Ouro do Futebol Brasileiro e da Primeira Academia…), eu bateria quase todos lá. Ou, então, cobraria curto, como todos, e sofreria como todos a marcação cerrada, em vez de inverter o lance, a bola, espaçar a marcação alheia, e criar lances inegavelmente poderosos e perigosos. Laterais que os adversários agora evitam conceder pelo perigo que criam nas cobranças de Moisés e casquinhas dos zagueiros verdes. Jogadas que os rivais evitam dar um bico para lateral. E, então, tentam sair jogando, trocar passes, e acabam perdendo essa bola – muitas vezes no pressing bem treinado e executado por um Palmeiras que abafa bastante a saída rival, na base do Porco Louco (versão 2016 do Galo Doido de 2013, que tinha os laterais de Marcos Rocha na área alheia…)

Feios laterais? Feio também é não fazer gol. É bater um lateral para um armador que nem sempre esse Palmeiras tem para prender a bola e gerar outro tipo de jogo. Feio e, mais que tudo, BURRO, é não usar a arma que você tem. Ainda mais com Mina e Vítor Hugo para subir à área, ao ataque, e onde nenhum rival tem conseguido marcá-los.

Guardiola só tinha Piqué e Busquets com 1m90 para cabecear no Barcelona. Por isso tinha várias jogadas de escanteios e faltas combinadas para sair jogando com Messi, Iniesta, Xavi, Villa e Pedro. Todos pelos 1m70 de baixura. Tivesse um Moisés para jogar na área para essas Minas aéreas, o campo minado terrestre seria menos utilizado. São armas de destruição e construção em massa que devem ser usadas. Não é crime. É artifício legítimo. É burrice não aproveitar.

Guardiola saía com o pé por ter time absurdamente qualificado e bastante baixo. Cuca vai por cima por ter time absurdamente capaz na força aérea e não tão qualificado para tocar bola. Como jornalista e pesquisador do jogo, não vejo problema algum – e, no sábado, a primeira das 13 maiores chances palmeirenses contra o Coritiba nasceu de um lateral de Moisés. Como torcedor, xará, só vejo solução. Como, em 1983, no time de Rubens Minelli, a gente comemorava escanteio para Jorginho Putinatti bater e Luís Pereira e Vagner Bacharel serem o que são Mina e VH em 2016.

É tudo questão de gosto. E nada que tire os inegáveis méritos de Cuca. Outro amigo querido que o futebol, o jornalismo e a vida me deram. Talvez eu não seja tão exigente com o tal do Cucabol por ser Cuca e ser Palmeiras. Talvez. Do mesmo modo que eu não seja tão exigente como são os críticos do Maurão por ser o Mauro que conheço e por ser o baita jornalista que ele é. Certamente.

Ou talvez seja mesmo por uma questão de estilo e de trabalho. Todos são respeitáveis. Muitas vezes elogiáveis. É só querer enxergar os méritos quando eles existem, e criticar os deméritos quando eles aparecem. Ninguém precisa ser amigo de ninguém. Mas precisa menos ainda ser inimigo para exercer seu trabalho. Antes de ser jornalista, somos pessoas. E, como tal, conversamos sem bloqueios. Como Cuca e Mauro conversaram no domingo. E como espero que todas as partes falem mais de futebol e menos de intrigas. Mais ou menos como amizades e famílias se separaram no Fla-Flu de coxinhas e mortadelas, joices e zés de abreu. Gente que ataca para se defender. Gente que não tolera e não conversa. Dá para ganhar de todo jeito, até sem muito jeito. E dá para perder tudo quando não se aceita a própria derrota, ou a vitória alheia.

Bola pra frente. Por baixo ou pelo alto.
P.S: recado do Maurão via WhatsApp:
"Caro xará, acabo de ler seu texto. Só para não ficar dúvida: bloqueio haters e quem ofende pela rede social porque não sou obrigado e ter qualquer tipo de contato, mesmo que virtual, com pessoas desse tipo. Infelizmente elas não são poucas e, consequentemente, os blocks batem a casa dos 20 mil. Paciência. Não sou contra maneiras de jogar, mas não acho que um time seja isento de críticas por liderar um certame, ainda mais o nosso (futebolisticamente) pobre campeonato. O Corinthians do ano passado era melhor que o atual líder, não só pela Liderança com L maiúsculo, com mais pontos de vantagem sobre os perseguidores mais próximos(?), como pelo futebol jogado. O futebol que se vê, não o futebol das estatísticas, que tanto utilizo, mas são como óculos, elas ajudam a enxergar, mas não servem para nada sozinhas. O Palmeiras tem elenco para jogar mais do que isso e Cuca está no clube há tempo bastante. Infelizmente regrediu em seu repertório, virou, sim, o "mestre" de um prato apenas. Minha cobrança, e disse isso a ele, é pela volta do Cuca de 2007. Com a experiência que ele tem hoje, seria um técnico melhor. E o Palmeiras, ouso afirmar, seria Líder com L maiúsculo como seu maior rival era há um ano. Saudações"

 

 

 

Sobre o Autor

Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério

Sobre o Blog

O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.

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