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Blog do Mauro Beting

Grêmio. Pentacampeão da Copa do Brasil. Porta-bandeiras.

Mauro Beting

08/12/2016 01h00


Meia-noite. 

Em ponto. 

Maicon levanta a taça. A Copa que só o Grêmio levantou cinco vezes. O primeiro a conquistar em 1989. O último a vencer em 2016. 

E não apenas o capitão levanta. Mais dois. Mais 55 mil na Arena com o maior número de gremistas na sua história. 
Tricolor de pai para filha. Patrimônio Portaluppi. Família porta-bandeira que dá bandeira invadindo campo. Não pode. Mas Portaluppis passam. Eles podem. O Grêmio pode. Mais que qualquer um na Copa de quem mais peleia que joga. A plêiade do Galo era melhor e maior. Mas o Grêmio foi mais time em BH e fez o jogo para não jogar o rival em POA. Grohe foi defender uma bola só aos 31 do segundo tempo. Mérito do Renato que chegou para ganhar a Copa com Espinosa. Grohe que fez bela homenagem aos companheiros de Chape no final e nem perto da bolaça de Cazares chegou no mais lindo gol inútil que já vi. O da final da Copa do Equador de 2016. O gol final de Cazares pro Galo. O gol da final de Bolaños pro Grêmio. 

Autor do primeiro e do último gol da campanha tricolor. Receptor das mais variadas, várias e até vadias críticas até o gol que ganhou de Everton, aos 43. Quando o Brasil da Copa e a Copa do Grêmio já sabiam que seriam imortais. 
É assim dede 1989. Portaluppi fez o planeta mais azul sob o comando de Espinosa, em 1983. Com Mário Sérgio lá pelo lado esquerdo em Tóquio como sei que esteve na cabine do Fox Sports. E de todas as transmissões irmanadas no mesmo uniforme verde. 

Na foto do querido Felipe Motta, do Fox Sports, o sentimento: será que é tão difícil ser uniforme? Será que é impossível dar crédito a quem merece? Será que não dá para vestir a mesma camisa do trabalho e não do emprego? Será que não dá para mais vezes jogar para o mesmo lado? Será que não dá para respeitar todas as cores e credos? Será que não dá para ser igual mesmo sendo diferente? Será que não dá para unir sem ser só na desgraça? Torcemos juntos, fãs do esporte. Somos todos campeões. Com emoção de verdade.

Pena que o calor do jogo, no fim, quase que estraga tudo de lindo que se viu nas homenagens que iluminaram a noite também no Couto Pereira, quando torcedores fizeram lindo em Curitiba, em nome da Chapecoense, e do amor que nos une.  

Mas o que vai ficar mesmo na noite campeã é o espírito tricolor. Imortal como os que partiram em Antioquia. Inesquecível como o tricolor que é Grêmio a pé, em pé, caído em segundas divisões, primeiro em Libertadores e Mundial, veterano copeiro, imortal vencedor de jogos eternos. Aflitos e Olímpicos, Moinho dos Ventos e Arenas, Baixada e no Humaitá, azedo na Azenha, doce e amargo, Grêmio e Tricolor.

Ninguém costuma dar muita bola ao Grêmio. Quase todos davam perdido o acesso em 2005 no pênalti de Galatto. No gol de Anderson que nem o mais fanático gremista (redundante) acreditava no fantástico e fabuloso.

Se é que gremista nasceu para não acreditar no Grêmio. Ele não torce. Ele acredita. Ele é Grêmio.

Eles são Grêmio para o que der e vencer. Mesmo que não venha, eles vão.
Fanáticos e fantásticos como tantos torcedores de tantos times com mais ou menos conquistas.

Mas os que são tricolores, que são gremistas, que já sofreram com o rival figadal, que já foram fidalgos ou não, esses parecem saber de algumas coisas que não sabemos quando o time deles joga.

Eles sabem que é possível. Podem ter menos time que os rivais. Podem ter menos dinheiro. Menos poder. Menos mídia. Menos gente.

Mas eles nunca têm menos torcida. Jamais têm menos fé.
O poder do Grêmio é esse.

Eles mais acreditam que torcem. Eles se acham mais predestinados. Guerreiros. Imortais. Invencíveis.

Claro que eles não são tudo isso.

Mas vá enfrentá-los! Em campo e nos bancos. Nos botecos e nos batuques. Nas bolas e nos papos. Na grama e na fama.

O tricolor não verga. Ele esgrima. Ele Grêmio.

Pode não vencer. Mas ele vai lutar.

É preciso respeitar até quando não se gosta e não se tolera e entende.
É preciso ser um pouco Grêmio para vencer o brasileiro mais uruguaio. Mais argentino. Mais alemão. Mais Grêmio.

É preciso ter um pouco dessa alma de avalanche para atropelar quem estiver pelo caminho.

Você pode não gostar do jeito, do jogo, dos modos, dos meios.

Mas você tem de respeitar essa história. Tem de entender essa glória. Tem de admirar essa gente cujo hino é de um Lupicínio que cantava a dor-de-cotovelo de corações dilacerados e compôs uma letra que poucos clubes têm: não fala de conquistas de galerias de troféus. Fala de sofrimento e encantamento de quem torce. De quem ama. De quem acredita.

De quem é Grêmio antes de ser gente. De gente que é Grêmio antes de ficar e ir a pé onde ele estiver.

Quase tudo isso eu já escrevi em 2013, nos 110 anos do clube. Mas hoje, mais de três anos depois, e mais de 15 do tetra da Copa do Brasil sacramentado em um 3 a 1 fora de casa no jogo final contra um "favorito" alvinegro (só que paulista), com Tite acima de todas as tretas e por baixo do tetra, o penta é mais do que especial. É mais do que gremista. 

É mais um toque para que o mundo da bola troque o discurso feito. Dá para ser campeão com méritos inegáveis ajustando o time e o elenco e a comissão técnica com bola rolando. Dá para ser vencedor com treinadores mais arejados e ousados e outros mais conservadores e "boleiros". Dá para ser campeão depois de 15 anos fazendo festa mesmo em meio a tanta dor.

Só não dá é para achar que já foi copeiro, já não é o mesmo, não voltará a ser, morre de véspera, acabou. 

Lara morreu sendo mais Grêmio que todos. Mas o Grêmio não morreu com Lara. O Tricolor morria na praia ou nem perto dela chegava. O torcedor voltava do Olímpico derrubado ou da Arena construída no frio da madrugada que varou noites e uma década e meia de seca e úmidos olhos. Mas muitos deles que quase deixavam de torcer, lá no fundo, sabiam que essa noite de pesadelos acabaria. 

Não por acaso, o pesadelo acabou com a taça levantada exatamente à meia-noite. Ou zero hora. Fim do dia. Ou começo do outro. Ontem. Ou amanhã. Fim. Ou começo. 

Um marco zero. Ou a quinta estrela.  

Tem muita coisa que a gente não sabe nesta vida. Mas uma delas eu sei. Tem de respeitar o Grêmio.  

Sobre o Autor

Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério

Sobre o Blog

O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.

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