Palmeiras ganhou do Botafogo e só foi campeão torcendo pelo rádio. Em 1969
Entenda lendo o capítulo do meu livro 0S 20 JOGOS ETERNOS DO PALMEIRAS (Maquinária Editora, 2014), escrito por mim, Fernando Galuppo, José Ezequiel Filho e Jota Christianini.
Ele conta 20 jogos históricos do clube como se fosse um diálogo entre o avô Beppe e o neto Angelo, com a ajuda dos amigos de credo e de verde.
O Palmeiras pode repetir 1969. Mas precisa de novo vencer o Botafogo que vem bem, apesar da derrota para a Chapecoense. O Cruzeiro precisa vencer o Santos, em BH, o que também não será fácil. E o Flamengo não pode vencer o Coritiba no Rio, o que parece improvável.
Não são grandes as chances de o Palmeiras ser campeão no domingo. Mas também não eram em 1969.
Leia:
ANGELO – Nonno, parece até que em todos os grandes jogos do Palmeiras você esteve presente no estádio. Teve algum jogo inesquecível que você celebrou ouvindo pelo rádio?
NONNO BEPPE– Teve a conquista do segundo torneio Roberto Gomes Pedrosa, em 1969. Vibrei demais no Morumbi com o que foi o nosso segundo título brasileiro. Ou melhor, nosso quarto campeonato, somando a Taça Brasil de 1960 e 1967. E mais a conquista do primeiro Robertão, como a gente chamava o torneio que foi, digamos assim, o pai do Brasileirão. Se há como discutir se a Taça Brasil já era o Campeonato Brasileiro (disputado com a esse nome a partir de 1971), é indiscutível que o Robertão foi o torneio que originou o Brasileirão.
FERNANDO GALUPPO – Também não dá para discutir o clube que mais títulos brasileiros conquistou, desde a primeira Taça Brasil, em 1959. Em 1967, menos ainda. Ganhamos dois nacionais numa só temporada! Faturamos tanto o primeiro Robertão, na vitória por 2 a 1 sobre o Grêmio, no Pacaembu, quanto a Taça Brasil, ganhando do Náutico por 2 a 0, no Maracanã, na terceira partida decisiva.
ANGELO – Como assim campeão brasileiro duas vezes em 1967?
NB – Foi o primeiro ano em que calendário brasileiro teve duas competições nacionais. Mais uma primazia palmeirense.
JOSÉ EZEQUIEL FILHO- A Taça Brasil foi o primeiro torneio realmente nacional organizado no Brasil. Em 1959, para definir quem seria o representante brasileiro na recém-criada Copa Libertadores, a CBD fez um torneio de caráter nacional reunindo os campeões estaduais. Nasceu a Taça Brasil. Como não havia outro torneio dessa amplitude, era o próprio Campeonato Brasileiro. O vencedor ia para a Libertadores do ano seguinte.
JOTA CHRISTIANINI – Como campeão paulista de 1959, aliás supercampeão!, o Palmeiras disputou nossa primeira Taça Brasil no ano seguinte, em 1960. Claro que vencemos! Com direito à maior goleada numa decisão nacional: 8 a 2 no Fortaleza. Feito que repetiríamos em 2008, goleando a Ponte Preta por 5 a 0, na maior goleada de uma decisão paulista desde 1902.
FG – A Taça Brasil é mais ou menos como é hoje a inchada Copa do Brasil. Porém, na época, era muito mais difícil participar. Só campeões estaduais participavam. Não tinham convidados.
JEF – Por isso alguns de nossos rivais municipais costumam desdenhar a Taça Brasil… Não é que eles nunca venceram o torneio, que durou de 1959 até 1968. O fato é que eles nunca disputaram! Ficaram anos sem títulos paulistas. Justamente na época de ouro do futebol brasileiro no mundo, ou ganhava o Palmeiras ou o Santos. Só nós e eles em São Paulo.
NB – De 1959 a 1966, de caráter nacional, só existia a Taça Brasil. Os campeões eram legítimos senhores dos campos brasileiros naqueles tempos. Mas, em 1967, foi ampliado o Torneio Rio-São Paulo (chamado Roberto Gomes de Pedrosa desde a morte do dirigente, em 1955). Clubes de Minas, Rio Grande do Sul e Paraná passaram a disputar um campeonato com quase sempre os melhores clubes da época. O Torneio Roberto Gomes Pedrosa ganhou o apelido de Robertão. Foi disputado de 1967 a 1970. Quando, em 1971, ele passou a ser chamado de Campeonato Brasileiro. Só isso. O Brasileirão que temos desde então, com uma série de regulamentos absurdos, viradas de mesa. Mas, enfim, quase que uma continuação do que vemos desde 1959. Ou, sem dúvida, desde o primeiro Robertão, em 1967. Para mim, a Taça Brasil é mãe da Copa do Brasil, que existe desde 1989. O Robertão é pai do Brasileirão.
FG – Melhor fez a CBF em 2010 para acabar com a discussão. Quem é campeão da Taça Brasil (1959 a 1968) é campeão brasileiro. Quem ganhou o Robertão (1967 a 1970) também é. Por isso somos octocampeões brasileiros. Com as duas Copas do Brasil (1998 e 2012) e mais a Copa dos Campeões (2000), somos o clube brasileiro que mais títulos nacionais conquistou. O clube que mais venceu títulos importantes do país do futebol.
NB – Talvez tivéssemos vencido mais um título. Em 1968, na última e esvaziada Taça Brasil, nenhum clube paulista participou. Eles preferiram disputar o Robertão. Um torneio desde sempre muito importante. E muito mais difícil de ser vencido que a Taça Brasil.
JEF – Não precisa dizer quem ganhou mais vezes o Robertão. O único clube que participou dos quatro quadrangulares finais.
FG – A Taça Brasil foi importantíssima para colocar no mapa brasileiro times de vários estados. Foram 80 clubes ao todo que a disputaram, de 1959 a 1968. Era um confronto mais regionalizado: apenas nas fases finais equipes do Norte-Nordeste enfrentavam rivais do Sul-Sudeste e Centro-Oeste. A Taça Brasil só foi ter algo além do mata-mata no regulamento nas duas últimas edições, com grupos nas fases preliminares. E quando já dividia o calendário com o Robertão.
JC – Já o Robertão foi o primeiro disputado em grupos, em ida e volta, e com caráter de campeonato, não de copa. No primeiro ano, em 1967, os 15 principais clubes de cinco estados mais poderosos da CBD foram os participantes; de 1968 a 1970, foram 17 equipes de sete estados. Ao todo, 22 clubes participaram, de 1967 a 1970. O Palmeiras foi o maior campeão do Robertão: duas vezes, em 1967 e 1969.
NB – Também foi o clube que mais pontos conquistou (104), o que mais venceu (41 jogos), o melhor aproveitamento de pontos (67%), o melhor ataque (118 gols), o melhor saldo de gols (45), e teve a terceira melhor média de gols sofridos.
FG – O Palmeiras em 1968 foi o melhor time da primeira fase. Mas entramos em parafuso no quadrangular decisivo, e levamos duas derrotas de três para Santos e Inter. Em 1970, a mesma história. Melhor campanha da primeira fase do Robertão. Mas uma derrota no primeiro jogo do quadrangular pro Fluminense daria o título para eles.
JC – Somados os nossos títulos da Taça Brasil de 1960 e 1967, com o Robertão de 1967 e 1969, e os Campeonatos Brasileiros de 1972-73, somos oficialmente o primeiro clube heptacampeão nacional, quando conquistamos o Brasileirão de 1993.
JEF – Logo, também fomos o primeiro octo, quando ganhamos o Brasileirão de 1994 contra o Corinthians.
ANGELO – Mas, então, Nonno: você estava no estádio na decisão do Robertão de 1969?
NB – Sim. Estava no Morumbi e vi a nossa vitória por 3 a 1. Mas ainda precisava ouvir a confirmação do título no jogo no Mineirão. Faltavam 32 minutos em Belo Horizonte. O Cruzeiro enfrentava o Corinthians e dependíamos do resultado em Minas para comemorar mais um título. Dos mais emocionantes e difíceis de nossa história. Ainda mais depois do maluco ano de 1968, quando fomos vice-campeões da Libertadores e, em seguida, quase rebaixados no Paulistão.
JC – Ainda em 1968 iniciamos uma reformulação no elenco campeoníssimo. Seu Valdir se aposentou na meta. Djalma Santos foi para o Atlético Paranaense. Servílio saiu em dezembro. No final do ano trocamos com o Grêmio o Tupãzinho pelo regular lateral-esquerdo Zeca. Negócio estranho na época. Mas um grande acerto na formação da Segunda Academia, nos anos 70.
FG – Contratamos 17 jogadores para 1969. Gastamos mais de 3 milhões de cruzeiros novos. Praticamente só ficaram Dudu e Ademir, claro! Além de Don Filpo Núñez, que retornara ao clube em agosto de 1968.
NB – De 1968 também permaneceram o Baldochi e o Minuca na zaga. O César Maluco ficou, depois de recontratado do Flamengo. Graças a Deus! E ao diabo, também.
JEF – No elenco para 1969 também permaneceu um lateral-direito que chegara ainda em 1968, do Botafogo de Ribeirão Preto. Eurico. E um rapazola de 18 anos vindo do São Bento. Luís Pereira. O maior zagueiro que tivemos. Ele foi a segunda opção da diretoria. A primeira era o zagueiro Paulo, do Guarani, grande revelação do Paulista de 1968. Perdemos (ou ganhamos) essa disputa para o Santos, que comprou a "revelação".
NB – Chegou ainda em 1968 o Artime, do Independiente da Argentina. Colosso de artilheiro. Pena que teve de ir embora antes. O cara era insaciável em todos os campos!
JC – Outro jovem que chegou em 1969 foi um goleiro do Comercial. Emerson Leão. E o Edu Bala, ponta-direita da Portuguesa. A segunda Academia de 1972 realmente começou já em 1969. Para não dizer 1968.
NB – O responsável pela grande reformulação que deu muito certo foi o diretor José Gimenez López, o Espanhol. Ele que bancou os reforços e, depois, a bronca com os maus resultados no início do Robertão de 1969.
JEF – Ele era uma figura. Carioca, torcia pelo Fluminense de criança até ver o Palestra jogar, em 1934. Virou palestrino. O único de uma família de corintianos. Dizia que era a ovelha verde por ser "o mais inteligente dos familiares". Tinha uma tese meio estapafúrdia de que jogador não podia ficar mais de quatro anos em um clube.
NB – Ele só admitia duas honrosas exceções. Dudu e Ademir da Guia. Ainda bem. O Divino tinha oito anos de Palmeiras. O Dudu tinha quatro de casa. Ficariam até 1976 (o Dudu) e 1977 (o Ademir).
FG – Fizemos boa campanha no Paulistão de 1969. Ganhamos o Torneio Início. Vencemos duas vezes o Santos. Mas o Pelé estava em dias de Pelé. No quadrangular final ele desequilibrou. Fomos vice-campeões, tirando o posto do Corinthians, vencendo o jogo por 3 a 2.
JC – Logo depois saiu o Filpo. Ele disse que alguns atletas tinham se vendido para o Santos, e, depois, falou mal de um monte de gente do clube em um restaurante. O papo chegou até os dirigentes que o demitiram. Assumiu o jovem Rubens Minelli, vindo do América de Rio Preto. Um dos maiores treinadores da história do futebol brasileiro. Ele foi montando o time (sem Artime) numa excursão pela África e Europa. Terminou conquistando o nosso primeiro Troféu Ramon de Carranza, na Europa. Eliminamos o Atlético de Madri e ganhamos do Real Madrid por 2 a 0.
FG – Mas o desgaste do giro de dois meses cobrou a conta na volta ao Brasil. Estreamos no Robertão quatro dias depois da vitória por 2 a 1 contra o Barcelona, num show do Ademir da Guia, na Espanha. Perdemos no Maracanã por 2 a 1 para o Flamengo. O elenco estava morto fisicamente.
NB – E teve mais! Pior: menos. No jogo seguinte, no Beira-Rio, perdemos por 3 a 0 para o Inter. No primeiro jogo no Palestra, derrota para o Cruzeiro por 1 a 0. O primeiro ponto veio no quarto jogo. Empate por 2 a 2 com o América carioca, em casa. Além do cansaço e de jogar mal, tínhamos jogadores com problemas contratuais. Enfim, o Palestra de sempre!
JEF – Perdemos a quarta perdida em cinco jogos na Fonte Nova. Foi 2 a 0 para o Bahia. Só fomos vencer a partida seguinte, no Arrudão. O César Maluco fez o último gol contra o Santa Cruz.
JC – Fez o último e os outros dois. Foi 3 a 2 para nós. Aleluia!
NB – Ele era demais. No Pacaembu, ganhamos o jogo seguinte. Dois a um no Santos. Pelé fez o dele. O César fez os nossos.
FG – Mas seguimos na base do perde-ganha danado. Estava muito difícil se classificar. Principalmente depois da derrota para o São Paulo por 2 a 1, no Palestra. O Leão foi mal naquele dia.
JEF – Mas o Minelli segurou a bronca legal. Do mesmo modo como o José Giménez Lopez o manteve depois do mau começo. Desde aquela época o Minelli entendia que as equipes só davam certo se os trabalhos dos treinadores fossem mantidos.
NB – Em 1969, diziam que ele era inexperiente, coisa e tal, que só tinha seis anos como técnico profissional. Mas o Minelli e o Giménez garantiram que só deixariam o clube como campeões do Robertão. O que, naquele momento, convenhamos, era bazófia.
ANGELO – Bazófia? Era o nome de um corneteiro famoso?
NB – Não. Mas poderia ser de outro coirmão. Enfim, mesmo pressionado o Minelli, vencemos os cinco últimos jogos da primeira fase. Estávamos classificados para mais um quadrangular final do Robertão. E ainda com a melhor campanha do grupo B.
JC – O Minelli encontrara o time. Fixara o Edu na ponta, com o Copeu sempre entrando no segundo tempo. O Pio ficara com a ponta esquerda, também ajudando mais atrás, no meio. Na frente, além do endiabrado César Maluco, o Jaime, que viera do Bangu, dava um equilíbrio muito bom, dando um pé também ao Dudu e ao Ademir no meio-campo. Era um 4-3-3 muito bem organizado, e que dava mais liberdade ao Ademir para chegar à frente.
NB – Sem contar o sistema defensivo que encaixou no final. Leão enfim virou titular absoluto; Eurico, Baldochi. Nelson que ainda não era Coruja e Zeca faziam uma ótima defesa. Com o Luisão Pereira pedindo passagem na reserva da zaga.
FG – No primeiro jogo do quadrangular final, empatamos sem gols com o Corinthians. Eles tinham a melhor campanha do campeonato. Mas, sabe como é…
JEF – Deu a lógica histórica. No outro jogo, Botafogo 2 x 2 Cruzeiro, no Rio. Na rodada seguinte, nosso maior rival venceu o Botafogo por 1 a 0. Nós fomos ao Mineirão e abrimos a contagem com o César. O Palhinha empatou no segundo tempo. Acabou assim.
NB – Na última rodada, no domingo, nós precisávamos vencer o Botafogo, no Morumbi. Mas se o Corinthians vencesse o Cruzeiro, no Mineirão, eles eram campeões. Pior: se o time do Tostão vencesse nossos rivais por três ou mais gols, dependendo do nosso resultado, os mineiros também tinham chance de título. O Palmeiras tinha de fazer o nosso papel e o nosso jogo e torcer por vitória magra do Cruzeiro, para que eles não nos superassem no saldo de gols. O Corinthians só dependia dele.
JC – O Edu não jogou na decisão. Entrou o Cardoso na ponta. O Botafogo tinha Jairzinho, mas não era tão forte como o timaço de 1968, campeão da Taça Brasil.
JEF – Éramos um time de chegada. Em dois meses e dez dias saímos da penúltima posição no campeonato para o título no saldo de gols.
NB – O time estava voando. Tanto que o novo treinador do Brasil, o João Saldanha, convocara o Leão e o Baldochi para a Seleção. Mas o que jogaram o Ademir e o Dudu na recuperação no Robertão foi uma grandeza. Ainda mais por que o Dudu não estava tão absoluto no time. E os ranzinzas continuavam insistindo que o Ademir deixava o time muito lento, que ele não corria em campo… Aqueles absurdos.
JEF – Realmente decisivo foi o César. O César Lemos. Ainda não era o César Maluco. Embora já fosse de berço. Ele foi fundamental na conquista do primeiro Robertão, em 1967. Depois caiu em desgraça, quase foi parar no Botafogo, voltou para o Flamengo, mas ficou de vez no Palestra e no nosso coração. Teve problemas com o Filpo, teria muitos depois com o mestre Brandão. Mas, dentro da área, ele só criava soluções para nós. Marcou 13 dos 28 gols do time no Robertão de 1969.
ANGELO – Mas como foi essa vitória contra o Botafogo?
NB – O jogo, em si, não foi tão difícil. Eles estavam sem o Paulo César Caju, Rogério e o Roberto Miranda. E não muito interessados. Depois de uma blitz inicial, o Ademir abriu o placar aos 11 minutos. O Cardoso cruzou da direta, o Chiquinho Pastor espanou e o Divino bateu cruzado.
FG – O César ampliou aos 27. Ele recebeu cabeçada do Cardoso depois de belo lançamento do Jaime. Estava fácil. O Maluco nem precisou acertar direitinho a bola na cabeçada para desviar do goleiro deles. Linha de passe de cabeça.
NB – O Divino fechou o primeiro tempo marcando o terceiro, aos 44, depois de tabela e lance de raça do César. O Ademir recebeu a bola do camisa nove caído, cortou o Valtencir, e bateu de direita. Falando assim parece fácil. E com o Ademir tudo ficava menos difícil.
JEF – Estávamos repetindo os 3 a 0 no Pacaembu da decisão antecipada do Rio-São Paulo de 1965. Aquele jogo em que o Ademir deu uma bola de colherinha pro Dario marcar o último golaço. Mas, em 1969, no segundo tempo, o Ferretti diminuiu, aos 10 minutos. Ficamos trocando bola ao estilo e na escola do Ademir e terminamos vencendo o jogo por 3 a 1.
JC – Teve um pênalti do goleiro Cao no César que o Armando Marques, sempre ele, não marcou, no comecinho do segundo tempo. Não precisávamos. Tanto que recuamos nosso time e ficamos esperando o tempo passar. Estávamos mais preocupados com o jogo do Mineirão, que estava atrasado em relação ao nosso. Aqueles absurdos típicos do futebol brasileiro. Aliás, se preciso fosse, pelo nosso time, e pela apatia do Botafogo, poderíamos ter feito muito mais que o 3 a 1, apesar do campo pesado.
JEF – Mas ainda dependíamos de mais 32 minutos de bola rolando no Mineirão. Lá, o Corinthians dependia apenas dele para ganhar o Robertão. Mas, com 50 segundos de jogo, o Evaldo fizera 1 a 0 para o Cruzeiro. A zica de um time no jejum de títulos derrubava o Corinthians com menos de um minuto.
NB – No apito final do Armando Marques no Morumbi, nossos jogadores mal celebraram a vitória e o título que, com aquela vitória do Cruzeiro por apenas 1 a 0, ainda era nosso. Até por que…
FG – No Mineirão, o genial Rivelino, palmeirense de berço, empatou aos 12 minutos para o Corinthians. Eles voltavam a estar a um gol do título. O gol de empate deles foi praticamente junto com o final do jogo no Morumbi.
NB – Confesso que tremi. Não confiava no Corinthians. Mas tinha minhas dúvidas em relação ao Cruzeiro, que era ótimo time, melhor que o deles, mas que estava com um jogador a menos.
JC – No vestiário, os nossos jogadores logo tomaram banho e ficaram ouvindo pequenos radinhos de pilha. Não havia TV. Apenas a narração das rádios direto do Mineirão. O empate por 1 a 1 ainda dava o título ao Palmeiras. Mas um gol do Corinthians daria o Robertão a eles, e terminaria com o jejum de títulos iniciado em 1954.
JEF – Alguns dos nossos jogadores ainda estavam no banho no Morumbi quando o vestiário foi invadido pelos berros de fora do estádio e também de dentro. Gol do Cruzeiro! O Dirceu Lopes, outro craque, fez 2 a 1, aos 23 minutos.
NB – O Cruzeiro vencia por 2 a 1. Éramos campeões. Mas, se fizesse 4 a 1, o time mineiro seria campeão pelo saldo.
FG – Ou, se o Corinthians virasse para 3 a 2, eles sairiam da fila.
JC – Muitos torcedores e conselheiros invadiram o vestiário do Morumbi em festa. Parecia tudo definido. Mas Minelli e os jogadores sabiam o que haviam sofrido até ali.
NB – Eu fazia o mesmo na frente do portão de entrada do Morumbi. Foram 32 minutos do apito final no nosso jogo para o encerramento da partida no Mineirão. Para mim, 32 anos. Ainda que estivéssemos mais que acostumados a títulos como ótimos palmeirenses, não era fácil torcer contra os dois times. Isso mesmo. Um por que era o Corinthians. Outro por que quem estava mais perto do título àquela hora era o Cruzeiro. Mais dois gols eles seriam campeões. Uma virada corintiana daria o título aos nossos rivais. Aquela descida da arquibancada do quase terminado Morumbi até próximo aos vestiários foi muito sofrida. Não aguentei ficar lá em cima. Fiquei com a maioria que estava na frente do estádio. Quando eu cheguei saiu o segundo gol do Cruzeiro. Nem assim fiquei aliviado.
JEF – Mas deu tudo mais que certo. E merecido. No apito final do jogo, pelo relato dos jornais, o César saiu correndo chorando e foi abraçar o Minelli, que também chorava. Não fosse o treinador, talvez o César estivesse no Botafogo naquela tarde.
NB– Lembro que, depois de me refazer e me reanimarem no Morumbi, fui até o Palestra. Cheguei a tempo de ver o Ademir da Guia sendo carregado pelos torcedores. Lembro o alto-falante tocando nosso hino até de madrugada. Mais um título que, confesso, lembro mais pelo hino e pelo desespero no radinho que pelo que jogamos na decisão contra o Botafogo.
JEF – A torcida acompanhou o ônibus da delegação até o Palestra. A festa corintiana estava pronta. Bandeiras dobradas embaixo do braço como "desodorantes".
JC – O Corinthians reclamou muito da tabela, da CBD, e da arbitragem no Mineirão.
NB – Reclamaram de um pênalti em Ivair e de um gol de Benê anulado por impedimento. Muita gente disse que eles foram realmente prejudicados.
JEF – Mas eles levaram o segundo gol quando tinham um jogador a mais em campo. É bom dizer. Como também é bom recordar o que gritei tanto quanto berrei "Palmeiras" na festa que foi até o final da noite, no Palestra: "um, dois, três, o Corinthians é freguês".
JC – Eu mais contei que cantei: "Um, dois, três, já vai pra 16". Eram então 16 anos sem títulos deles.
NB – Também é dever contar que pouco mais de oito mil palmeirenses estavam no Morumbi.
ANGELO – Só oito mil, Nonno?
NB – O mesmo aconteceria na fase decisiva do Brasileirão de 1972, quando precisávamos vencer o Coritiba, no Palestra, e torcer para o América ganhar do São Paulo, no Rio. Os dois resultados aconteceram e ganhamos o Brasileirão rodadas depois. Pena que apenas oito mil estavam confiando no nosso time no Morumbi e, quatro anos depois, no Palestra.
ANGELO – Acho que sempre estivemos muito mal acostumados com títulos e nem precisávamos ir aos estádios…
NB – É. Melhor pensar assim.
ANGELO – Mas é o que você sempre diz, Nonno. Somos muito corneteiros. Muito exigentes.
NB – Tem razão. Mas o Palmeiras é um presente na nossa vida. Precisamos sempre estar presentes onde estiver o Palmeiras.
JEF – A festa da entrega das faixas foi logo na quarta-feira. Ganhamos da seleção de Gana por 3 a 1, no Palestra. O jogo foi marcado na segunda-feira. Era para ser Corinthians x Gana. O presidente deles, o deputado Wadih Helou, tinha programado para ser o jogo da entrega das faixas alvinegras. Só esqueceu um pequeno detalhe…
FG – Então, o Palmeiras resolveu "assumir" o amistoso. Quase que não teve jogo, que foi difícil encontrar os atletas, que estavam dispensados para curtirem o título.
NB – Não esqueço o time entrando em campo com nossa bandeira, a de São Paulo e a do Brasil. O Minguinho, chefe da torcida, entrou de fraque e uma máscara de periquito na cabeça.
JC – O mais aplaudido foi o César, que recebeu um prêmio pelo gol mais bonito do campeonato. Nem lembro qual! Foram tantos!
JEF – Lembro de, no outro domingo, ter visto uma reportagem no programa da Hebe Camargo, no Canal 7, a TV Record. Ela gravou com todo o elenco, cantou, até pênalti bateu no Ademir da Guia. Ou foi o contrário?
JC – Lembro vários artistas palmeirenses presentes na festa. Sergio Reis e Francisco Petrônio entregaram faixas para atletas. Foi uma alegria contra Gana.
NB – Era sempre uma festa o Palmeiras. Pelo que jogávamos. Pelo que os nossos rivais nos ajudavam.
JEF – Passados 30 anos, na Sala de Troféus, eu estava como Ademir diante da taça de 69, com alguns visitantes. Falei ao Divino: "Diga às pessoas como fez os dois gols da 'final' contra o Botafogo. Ele respondeu: "Você está enganado, não fiz nenhum gol naquela partida". Fiquei quieto. Precisei mostrar a súmula, e, então, o Ademir me disse, com aquela humildade divina: "Ih! Esqueci!".
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