Topo

Blog do Mauro Beting

Neymar provoca, simula e apanha demais, mas não merece ser tão perseguido dentro e fora de campo

Mauro Beting

03/07/2018 09h58

ARTE: MILTON TRAJANO

Professor Osorio, e tropa de choque que adora não gostar de Neymar ou de quem é muito querido. Ou que adoram comparar qualquer terráqueo com o incomparável ET Pelé, abusando de imagens insuperáveis do Rei para demonstrar a tese de que Ele só respondia na bola…

Redimam-se terráqueos e pecadores. O Rei também desceu a este mundo e cometeu seus pecados enquanto Edson. Admitidos por Ele mesmo. Pena que os súditos se tornam os piores vassalos. Ou bobos da corte sem graça.

Três revides reais são famosos. Provas apenas da humanidade falível de Edson.

Do Pelé que apelou.

6/6/1965. Brasil 2 x 0 Alemanha. AMISTOSO no Maracanã… Os alemães cometeram 39 das 60 faltas marcadas no a-mis-to-so. Pelé, como sempre, sofreu a maioria delas. Não poucas desleais. Hottges, que 9 anos depois seria campeão do mundo em 1974 com os alemães ocidentais, se lesionou no final do primeiro tempo depois de mais uma pancada que deu em Garrincha. Seu substituto, Giesemann, sairia ainda pior.

Pelé apanhou muito e jogou tanto quanto. Do mesmo modo como reclamou da violência adversária e do pouco caso que o mau árbitro Carlos Rivero fez da pancadaria do seu marcador Schulz. E não apenas ele esfolava o Rei.

Faltando três minutos para acabar o amistoso, Pelé descontou em Giesemann, que seguia a linha dura de Hottges e baixava o pau em Mané. Quase nenhuma testemunha que viu o lance alivia para o Rei. Ele respondeu na maldade a tantas entradas duras e foi direto na perna direita do lateral alemão que partia para o ataque. Giesemann teve a perna partida e nunca mais atuou pela Alemanha. Não poucos torcedores vaiaram Pelé até o final do jogo, mesmo depois do segundo gol brasileiro.

13/10/1968. Procópio, zagueiro do Cruzeiro e de Seleção que tantas vezes pegou pesado com Pelé, e não apenas com Ele, driblou o Rei no Morumbi. Ele foi no joelho esquerdo de Procópio. O zagueiro desmaiou com a rótula saindo do lugar depois da entrada que ninguém que viu alivia de Pelé. Procópio ficaria 5 anos, um mês e 13 dias até voltar a atuar pelo Cruzeiro. O Santos venceu por 2 a 0 o jogo. Pelé anos mais tarde se desculparia daquele acidente de trabalho.

17/6/1970. Semifinal da Copa no México. Estava no placar Brasil 2 x 1 Uruguai. Pelé escapava pela esquerda. Não estava vigiado como de costume pelo violento volante Montero Castillo. Quem foi atrás Dele foi Fontes, que minutos antes havia pisado no Rei que estava caído no gramado depois de um lance sensacional. O uruguaio chegou num carrinho duro. Mas pegou só na bola. Antes, porém, foi atingido por uma cotovelada com o braço direito de Pelé. Parecida com a que em 1994 tiraria o italiano Tassotti por oito jogos de Copa depois de atingir o nariz do espanhol Luis Enrique. Lance semelhante ao que Leonardo atingiu o norte-americano Tab Ramos e suspendeu o lateral brasileiro da mesma Copa, uma rodada antes.

Em 1970, o árbitro não viu a agressão real como o juiz 24 anos depois expulsaria Leonardo. E nem havia um tribunal para punir pelo vídeo e suspender Tassotti depois da partida na agressão não vista no campo.

Na semifinal do Mundial no México, o árbitro não expulsou Pelé como deveria. E ainda marcou falta do uruguaio que foi agredido pelo Rei. Pelé depois daria o passe pro terceiro gol contra o Uruguai e logo após daria o famoso drible da vaca em Mazurkiewicz. Na final que não deveria ter disputado pela agressão não vista, Ele abriu o placar nos 4 a 1 contra a Itália.

Neymar não é exemplo de disciplina. Ele se perde muitas vezes em simulações. Nas reclamações ostensivas. Nos bate-bocas desnecessários. Tite trabalhou e conversou bastante com ele a respeito.

Não é fácil apanhar como Neymar sofre – e ainda assim menos do que Pelé sofria, mas mais do que qualquer atleta no mundo nos últimos cinco anos. O 10 brasileiro é quem mais sofre faltas, mais cava faltas e, possivelmente, mais simula faltas.

Não é para qualquer um responder só pela bola a tanta pancada e provocação – como ele também provoca pelo seu jogo e talento e não poucos abusos e firulas. Dalai Lama certamente não atiçaria tanto os marcadores. Mas talvez Jó também distribuiria seus revides se apanhasse tanto.

Neymar nunca teve lances de revanche como os de Pelé. Para o melhor de Pelé – que ninguém neste mundo consegue. E também para o pior Dele – que a turma da memória nada seletiva adora odiar Neymar e não necessariamente defender Pelé. Ainda mais quando Edson foi indefensável em três momentos lamentáveis de revides despropositados.

Pelé tem muito mais momentos maravilhosos em que respondia jogando, sem simulações, chororôs e mimimis. Mas contar apenas uma parte da história é injusto. É errado como foi Pelé.

Neymar não merece ser perseguido fora de campo como é caçado dentro dele. Se ele simula muitas situações, muitos nem se preocupam em dissimular o prazer de marcá-lo a ferro, fogo e erro.

Sobre o Autor

Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério

Sobre o Blog

O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.

Blog do Mauro Beting