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Blog do Mauro Beting

Torcedor experience do Brasil

Mauro Beting

17/06/2019 09h53

Eu fui um torcedor corporativo na abertura da Copa América. Minha mulher e meus parceiros Careca e Amaral estávamos todos lá em um evento de um banco. Falamos muito de futebol e Seleção em uma resenha para executivos em um belíssimo hotel. Fomos de van pro Morumbi. Camarote. Comida. Bebida. VIP. Simpática festa de abertura. Tema musical que empolgou tanto quanto o jogo entre o favorito ao título x o favorito à lanterna do torneio.

Final do primeiro tempo de quase nenhuma chance brasileira de um time em que Richarlison corria, David Neres não acertava um drible, Coutinho, os passes. Firmino só abria espaços. Daniel Alves espetava, Felipe Luís armava por dentro, Marquinhos e Thiago Silva trocavam passes, Casemiro e Fernandinho, burocracia. Alisson assistia ao jogo como os que pagaram pela maior renda da história. Ou bebiam nas tendas corporativas.

Intervalo pedido pelo árbitro, quase nenhum apupo. Zero apuro de sofrimento. Zero apuro de esmero. Não era cemitério porque se precisa respeitar o do Morumbi onde minha família tem a última morada. Não era casa de concerto porque não parecia ter conserto. Não era ópera nem bufa. O Brasil era visita. Indesejável.

Era um jogo apático que o VAR animou dando um pênalti caseiro. Coutinho ampliou. Everton fechou a conta que não fecha. Como a torcida paulista usualmente não fecha com a Seleção.

Em 1946, tanto o torcedor estava P da vida de Puto e de Paulista e Paulistano com o Brasil de Flávio Costa que ele quase torceu pela Argentina. Em 1949, no Sul-Americano, o treinador inventou a escalação geopolítica ainda de birra pelos berros bairristas de 1946. Um time mais "brasileiro" em São Januário. Outro mais "paulista" no Pacaembu. Assim se fez o que não se faz. E se refez no Mundial em 1950. Em São Paulo, no empate contra a "neutra" Suíça, um time paulista no Pacaembu. Outro titular no Maracanã. O que iria até a final da Copa.

Bobagem. Mas era a bagagem clubista bairrista se carrega e encarregava de atrasar nosso jogo. Essa burra birra que estagnou até os anos 80 a nossa bola dividida pelo DDD.

Algo que ainda infelicita. E mais ainda por cada vez menos termos jogadores "paulistas", "gaúchos", "cariocas", etc. Eles não jogam mais aqui. Ou mal jogaram pelo Brasil. São do mundo. Mais do que de casa. São ingleses e espanhóis e até chineses e ucranianos. Não são Flamengo e Corinthians.

Não tem motivo para tamanha birra contra aletas pelos seus contratos.

Mas vaiar seleção independe de camisa. Ou até do desempenho. Vaiamos porque é praxe. Pixo básico. Protesto padrão. E jogamos na Seleção e nos selecionados nossas frustrações e fraturas.

Ganhando como era obrigação contra a Bolívia. Vencendo quando não é.

O silêncio do Morumbi é melhor do que a vaia que Caju recebeu em 1970. Os xingamentos a Parreira, Zagallo e Dunga em 1993. As bandeiras no gramado em 2000. Melhor deixar pra lá do que detonar por aqui.

Também passa esse incerto desinteresse pela "grã-fina da narinas cadavéricas" de Nelson Rodrigues que ia ao Maracanã perguntar quem era a bola. Temos personagens corporativas desse tipo. Dos que choram com derrotas até serem flagrados no telão. Dos que mais tiram selfies do que são tirados do sério pelo jogo.

Mas, neste momento de reconstrução nacional, melhor o silêncio dos culpados ao barulho dos inocentes.

Sobre o Autor

Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério

Sobre o Blog

O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.

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