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Dia de quem abraça e não chuta a bola

Mauro Beting

26/04/2016 12h52

 

POR MILTON TRAJANO

 

O único número um que não é o primeiro da turma é o goleiro. Para gente do jogo, melhor seria se fosse o número zero. Tem quem acha o goleiro um zero à esquerda que fica no meio do gol só por não saber chutar a bola com a direita. É um mártir crucificado nos postes da meta por um só lance. Como Barbosa, que pagou pela vida uma culpa que não teve no gol da vitória do Uruguai, no Maracanazo de 1950. Tantas defesas não o salvaram dos ataques injustos. Ficou o gol. Não sobrou o goleiro.

 

O centroavante que perde todos os feitos e acha um gol sem querer é o herói. Mas o goleiro que opera milagres apenas "está lá para isso mesmo", como até os próprios profissionais do ofício repetem sem pensar. São aqueles chavões que pegam mais do que os grandes goleiros catam. Com o devido respeito, e em nome dos que, como eu, nas várzeas da vida, têm o prazer de estragar a alegria e a artilharia alheia:

 

– Vão se catar!

 

Disse Pompeia, épico arqueiro do América carioca: "Quem mais gosta da bola é o goleiro. Todo mundo a chuta, só o goleiro a abraça". E ainda assim é chutado pelo mundo do futebol. Ninguém dá bola a ele. O anjo-guardião de uma meta é o estraga-prazer profissional. O único que pode pegar com as mãos e se vestir de outro modo. Vai ver que por isso ele é mesmo único. Um. Que joga por 11. Que troca os pés pelas mãos. Que merece todos os elogios que não recebe.

 

O futebol pentacampeão mundial tem um dia dos antecessores e sucessores de Gilmar dos Santos Neves e de outros craques das traves. Craques que nem o reconhecimento como tais recebem. Não há uma expressão que nomeie um goleiro-craque. Mas goleiro frangueiro nem precisa explicação.

                   

Goleiro ou é maluco ou é. Onde ele pisa não nasce. Goleiro é bagrecéfalo. Goleiro não sabe. Goleiro não.

 

Não, senhores. Goleiro? Sim! Goleiro vira santo, jogador de linha é o diabo. Goleiro veste a camisa diferente, mas poucos no mundo são tão leais quanto os goleiros a essas cores. Tão importante e respeitoso é que trata a bola com luvas. Tão necessário que o time começa com ele. Tão nosso que ele é, normalmente, quem celebra sozinho os gols do time. Ou mesmo as defesas dele. No fundo ele é cada um de nós nessa loucura que é o futebol. A mais solitária celebração mais universal. Aquela comemoração de todos, de fato, é uma festa individual. Um gol faz você abraçar o belzebu na arquibancada e no boteco se ele tiver as suas cores. É do jogo.

 

Pena que nossos santos não podem ser abraçados por nós como eles abraçam nossas cores e a bola de outras cores.

 

Nesse Dia do Goleiro, abrace o seu como ele nos abraça.

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Sobre o Autor

Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério

Sobre o Blog

O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.

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