Até o apagar da velha chama. Os manos pira!
Mauro Beting
04/08/2016 14h53
Sei que a água é água, embora possa não ser inodora, insípida e incolor. Que adubo é adubo, MC Biel é MC Biel, e vice-versa, embora nem tudo que versa é vice.
Mas o fogo, de fato, é mesmo fogo.
A tocha é rocha. Mancha. Brocha. É o bicho, animal. Queima. Esquenta. Aconchega. Acalenta. Esturrica. Esmerilha.
Tem quem acha trouxa quem trouxe o espírito olímpico. É fogo agradar a gregos e troianos desde os jogos olímpicos da antiguidade. Queima os olhos ver ex-craques dos esportes preteridos por escroques nacionais na condução do estandarte. Incinera a alma o desfile comercial de potestades e prepotências. Inflama a dignidade saber quanto deixamos de fazer, quanto deixamos eles fazerem.
Chamusca muita coisa privada nessa cidade falida pela administração pública. Cresta da janela ver o Redentor que lindo na crise da onda que se ergueu no mar e afogou ciclovia. Tosta o cidadão desalojado pelo projeto olímpico de ganhar medalha, medalha, medalha como se fosse Mutley. Tisna o planejamento urbano que faz do pódio um palanque, da palafita a plataforma.
Funde o cofre com saltos orçamentais. Danifica o apartamento disfuncional. Desbarata a zica e zica as baratas. Dilapida o patrimônio. Malbarata o caro. Esbanja o que não pode. Dissipa o que não deve. Liquida o que não paga e não tem preço.
Carboniza o presente e crema o futuro. Creme de lá, crime daqui.
Desprestigia o Pan. Aborrece os pais e mães. Zanga o Paes. Tosta os paes da Austrália e os netos do mundo.
Desacredita a luz do fogo. Arde a inspiração dos atletas que se importam não só em competir. Se importam com o legado largado. Com o delegado que manda prender e não manda soltar. Com o respaldo abrasado da oportunidade apagada com a pira.
Fogacho perdido pelo jeitinho de achar que não tem jeito. Lumieira sem eira e só bobeira. Facho sossegado do povo que só se levanta para gritar gol. Ou para xingar quem não é ouro.
Ferro fundido no tacho do capeta. Fulguras ó Rio florão da América. Iluminado ao pré-sal do velho mundo.
Fogo que é pileque de adulto e moleque. Porre de quem leva porrada da vida. Foguete de quem tem artifício, mas que dá xabu com fogo amigo.
Das estrelas e medalhas que não vamos esquecer de contar, tem muita história linda. Da primeira vez era a cidade maravilhosa. Da segunda, o caos e a eternidade que esquecemos de orçar.
O resto é mar.
Chamo a consciência de que os jogos vão começar. Mas a nossa maratona não acaba quando a pira se apagar.
Sobre o Autor
Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério
Sobre o Blog
O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.