Olé do Brasil e o futebol
Mauro Beting
17/09/2016 09h56
DESCULPE O TRANSTORNO, PRECISO FALAR DE FUTEBOL
Conheci ele na TV. Tinha mais ou menos 6 anos. Era a década de 90, que foi absolutamente mágica para o torcedor, porque naquela época havia zoeira e craques em abundância no futebol brasileiro.
Foi quase amor à primeira vista. Só não me me apaixonei instantaneamente, porque não entendia direito como funcionava. As regras, o impedimento, as posições, a estratégia. Para se ter uma ideia, eu achava que o lateral estava em campo apenas para cobrar lateral. Até perguntei se era isso mesmo para o meu pai, que, pacientemente, me explicou. Mesmo sem saber o que Cafu, Roberto Carlos, Arce, Branco e companhia estavam fazendo em campo, já gostava desse negócio chamado futebol. Simplesmente já gostava muito.
Gostava tanto, que comecei a jogar. Como a maioria dos brasileiros, iniciei na rua mesmo. O portão ou os chinelos era o gol; a bola era qualquer objeto que pudesse ser chutado. Além dos adversários, durante as partidas, enfrentava os vizinhos, que reclamavam e ameaçavam furar ou roubar a bola; os carros, que interrompiam as partidas constantemente, já que passavam justamente pelo campo de jogo, e, claro, as lesões causadas pelo paralelepípedo. Quem jogou na rua sabe. Perto do paralelepípedo, o asfalto era como o gramado do Santiago Bernabéu. Não dizem que o amor pode machucar?. Verdade! Afinal, quem nunca arrancou o tampão do dedo jogando bola na rua?
Cresci assistindo a todos os jogos que passavam na TV e jogando sempre que podia, tanto na escola quanto na rua. Não demorou para entender como o jogo funciona. Quando entendi, passei a amar de verdade. Decorei de forma natural, sem querer, todas as grandes escalações da década de 1990 e não esqueci até hoje. Que saudade daqueles esquadrões e daqueles grandes clássicos!
Para os mais jovens: quase todos os times grandes dessa década tinham craques. Raramente havia furo no time. Eram dois meias que jogavam muito, dois atacantes que jogavam muito, dois grandes zagueiros, e assim vai. Clube grande tinha grande time. Era como tem que ser.
Os grandes confrontos, as bandeiras, o mistério na escalação, a loucura do dia de clássico. Mesmo que eu quisesse não amar o futebol, era impossível. Não existe esporte mais apaixonante no mundo. Não é possível escapar do cupido do futebol.
Tive o privilégio de ver o Brasil de 1994 levar a taça. Era muito jovem, mas me lembro de todos os jogos, dos gols, da narração do Galvão Bueno, do grito de tetra com o Pelé. O youtube ajuda a não esquecer tudo isso, claro, mas nem precisaria. A minha experiência como tetracampeão ainda está muito viva. Lembro de ver os jogos com a família na minha antiga casa, das músicas promocionais da Copa, de sair para a rua e festejar. O futebol marca.
Desenvolvi a zoeira futebolística – quem lê este texto conhece o Olé do Brasil – com os melhores: Túlio, Edmundo, Romário, Djalminha, Junior Baiano, Edílson, Paulo Nunes, Marcelino Carioca, Vampeta… A lista é infinita! Aprendi com os melhores, definitivamente. Com esses caras, aprendi outra coisa muito importante: tem que saber zoar e, principalmente, ser zoado. Faz parte do futebol.
Comecei compartilhando zoeira pessoalmente na escola e com os amigos em geral. Depois, passei a usar e-mail, MSN, SMS, Orkut, Facebook, Twitter, Whatsapp e vamos todos continuar no que vier pela frente.
Fiz centenas de amigos por causa do futebol. Tive centenas de discussões por causa do futebol. Tem um monte de gente que eu gosto e só encontro por causa do futebol. Tem um monte de gente que não gosto e humilhei dando caneta ou chapéu durante uma partida de futebol. Em tempo: melhor sensação.
Graças ao futebol, compartilhei emoções idênticas com milhões de pessoas muito diferentes de mim e que nunca conheci. Acredito que o futebol seja o único tipo de amor que estamos dispostos a dividir com bilhões de pessoas. O futebol é realmente mágico.
Entretanto, como tudo na vida, o futebol é imperfeito *. Mas são apenas dois defeitos: o primeiro é o escanteio curto; o segundo, são os "erros" dos árbitros.
Existe outro defeito, mas esse não é bem do futebol: são as pessoas que dizem que é apenas um jogo. Sobre elas, apenas digo: que Deus perdoe essas pessoas ruins.
* Menos a Paola de Oliveira. Ela é a única coisa dessa vida que é realmente perfeita.
Sobre o Autor
Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério
Sobre o Blog
O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.