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40 anos dos 22. Os dias antes do 13 de outubro de 1977.

Mauro Beting

02/05/2017 11h47

 01/10/1977. Sábado. No Grupo F, no Morumbi, no dia seguinte, São Paulo jogaria pelo empate contra o Corinthians que não vencia um Paulista desde 1954. Basílio e Geraldo estavam lesionados. Mas pareciam prontos a ir ao jogo. Empréstimo do ponta Edu com o Santos terminava naquele sábado. As chances alvinegras pareciam acabadas quando o Corinthians perdeu no Pacaembu para o Guarani por 1 a 0. Teria de vencer o ótimo Botafogo de Sócrates em Ribeirão, em 25 de setembro. Ganhou por 1 a 0. Teria de vencer a Portuguesa de Enéas. Ganhou da Lusa por 1 a 0, no dia 29. O que parecia eliminado tinha virado o jogo. Mas ainda precisava vencer o Majestoso para disputar a final estadual pela primeira vez desde 1974. Mais de 10 mil ingressos vendidos no Parque São Jorge para o clássico no estádio tricolor. Quem passasse enfrentaria a melhor equipe do campeonato. No Grupo E, a Ponte Preta já estava classificada. Oscar teria de atuar com seguro por estar sem contrato com a Macaca. Ele que fazia com Carlos, Jair (Picerni), Polozi e Odirlei a melhor defesa da história do clube.

02/10/1977. São Paulo jogava pelo empate para se classificar para a final do Paulista contra a Ponte Preta. Mas a sina dos três Majestosos anteriores se repetiu. O Corinthians venceu por 2 a 1 e vai decidir o Paulistão numa melhor de quatro pontos (a vitória valia dois pontos). UM, DOIS, TRÊS, O SÃO PAULO É O FREGUÊS foi o coro alvinegro depois de Geraldão abrir o placar, aos 41. Romeu fez o segundo e honrou o apelido Cambalhota, aos 9. Serginho Chulapa diminuiu, mas Oscar Scolfaro marcou falta muito discutível em Moisés. Chulapa faria o gol aos 32, em lance reclamado pelos corintianos – a bola não entrou. 

OLÉ, OLÁ, O TIMÃO TÁ BOTANDO PRA QUEBRAR foi o coro durante o jogo de vitória merecida, apesar da arbitragem ruim para os dois lados. "O São Paulo foi garfado", disse José Douglas Dallora, cartola do Tricolor. Vaguinho e Romeu saíram suspensos para a primeira decisão. O ponta-direita virou pai naquela tarde de domingo. 

O Corinthians lutava para acabar com 22 anos sem títulos.

 03/10/1977. Reunião na FPF no começo da noite de segunda decide que as finais do Paulista serão no Morumbi. "Campo neutro". Ponte queria ao menos um jogo em Campinas. Ou pelo menos um no Pacaembu. Não conseguiu. "Cartas marcadas", reclamou o presidente Lauro Morais Filho. Ponte oferecia aumentar preços de ingressos. Os 35 mil lugares (então) do Moisés Lucarelli garantiam boa renda. Alfredo Metidieri, presidente da FPF, não quis jogo. Macaca também queria um sorteio de arbitragem com os apitadores da Fifa. Romualdo Arppi Filho, José Favile Neto, Oscar Scolfaro. Timão vetou Scolfaro (morava em Campinas…). Faville estava processando o presidente corintiano Vicente Matheus (foto)… Romualdo, o mais técnico e TÁTICO árbitro da história, ficou de fora. Dulcídio Boschillia foi o escolhido. Ingressos mais caros no Morumbi custarão 100 cruzeiros. Globo pagou 12 milhões e meio de cruzeiros pelos direitos de transmissão dos três jogos. Se houver terceiro jogo, será em 13 de outubro, porque dia 12 tem amistoso do Brasil x Milan.

04/10/1977. Ponte Preta muda horário de treinos em Campinas na terça-feira para evitar "olheiros" corintianos… Lúcio é dúvida na Ponte Preta. Se não jogasse, o ponta-direita reserva Afrânio entraria. Ele que seria treinador do Corinthians em 1994. Zé Duarte garante que o time que ele dirige é melhor tecnicamente que o Corinthians. "Nosso meio-campo (Vanderlei, Marco Aurélio e Dicá) é excelente. Nossa zaga (Oscar e Polozi) é das melhores do Brasil". Os próprios corintianos admitem a superioridade da Ponte. Mas Brandão garante que o Timão dele será campeão pela primeira vez desde 1954. "Quando cheguei em 28 de março de 1977, rezei para que fossemos campeões". Basílio é dúvida na primeira final, quarta, dia 5 de outubro, 21h15. Para o primeiro jogo, 123.600 ingressos foram colocados à venda. 300 ônibus virão de Campinas. Além da Globo, Tupi, Record, Bandeirantes, Gazeta e Cultura deverão transmitir também os jogos. Mesmo para a capital. 

05/10/1977. Corinthians vence a primeira decisiva no Morumbi. Palhinha entrou sozinho e bateu. O goleiraço Carlos abafou bem, mas o rebote explodiu no rosto do camisa 10 corintiano e definiu o placar, aos 14 minutos. Sem os pontas Vaguinho e Romeu, Brandão fechou o meio-campo com Luciano e Adãozinho. A Ponte ficou mais com a bola, teve mais chances, finalizou mais. Mas não conseguiu empatar. "Afunilamos muito o jogo, cruzamos muitas bolas…", lamentou Zé Duarte. Palhinha não apenas fez o gol, mas jogou demais, e em todo o campo. Tobias recebeu o terceiro amarelo em confusão com Rui Rei e não joga a segunda partida que pode ser a decisiva. Foram 65 mil pagantes no primeiro jogo. A Ponte jogou com o timaço histórico. O Corinthians com Tobias; Zé Maria, Moisés, Zé Eduardo (recentemente falecido) e Wladimir; Russo, Luciano e Palhinha; Basílio, Geraldão e Adãozinho. O governador paulista Paulo Egídio Martins, nomeado pela ditadura militar, estava eufórico na tribuna do estádio, ao lado do corintiano Vicente Matheus (foto acima). E falava do futuro estádio corintiano, que seria erguido na avenida Aricanduva, a 10 minutos do metrô, em terreno doado pelo prefeito Olavo Setúbal. "O povo (do Corinthians) merece ter um estádio. Ele será financiado pela Nossa Caixa". Torcida da Ponte foi reforçada por palmeirenses e são-paulinos, inclusive com bandeiras. O famoso coro de "1, 2, 3" até 23 e o indefectível "parabéns a você". A resposta corintiana era "caipiras". 

Veja o gol da vitória de Palhinha com a narração de Osmar Santos

06/10/1977. Brandão afirma na quinta-feira que o Corinthians não jogará pelo empate no domingo, no Morumbi. Treinador corintiano quer jogar para vencer, até para cancelar a terceira partida. Ele só definiu Jairo como goleiro titular, no lugar do suspenso Tobias. Vicente Matheus pensa em pagar 100 mil cruzeiros de prêmio para cada atleta campeão. Vereador José Bustamante solicitou ao prefeito Olavo Setúbal o decreto de ponto facultativo na capital para a celebração do possível título corintiano, na segunda, depois do segundo jogo. Não houve resposta. Fiel corintiana pretende mais uma vez celebrar na Avenida Paulista, como havia sido nas semifinais do BR-76, na Invasão do Maracanã. Muita gente ouviu o primeiro jogo de quarta-feira na avenida, pelo rádio. E explodiu com o gol da vitória de Palhinha, aos 14. No dia seguinte, na FOLHA, reportagem falando da provável festa da torcida do Corinthians no domingo seria usada pela Macaca para motivar ainda mais o time (foto). 

07/10/1977. Ponte Preta manda ofício de 10 paginas para a FPF contra a escalação de Romualdo Arppi Filho para o segundo jogo decisivo, dois dias depois. "Existe nos bastidores da federação uma diabólica trama para desnivelar o resultado da partida de domingo (que seria vendida pela Ponte…). FPF responde duro e pede para que a Ponte ganhe o Paulista dentro de campo. Boatos na tarde diziam que Adãozinho teria atuado dopado. Era mentira. DSV determina que Avenida Paulista ficará fechada entre Haddock Lobo e Brigadeiro caso o Corinthians vença no domingo, o segundo jogo decisivo do Paulista de 1977. Dentro do Morumbi deverão ser mil PMs e mais dois mil fora do estádio. São esperados muito mais que os 65 mil torcedores do primeiro jogo, na quarta. Vicente Matheus determina que o Parque São Jorge seja fechado no domingo e na segunda em caso de festa corintiana. 

 


08/10/1977. Ingressos praticamente esgotados no sábado para a decisão no Morumbi, no domingo. Corinthians concentrado no Rancho Silvestre, no Embu. Ponte no Holiday, em Campinas. Manchete do dia seguinte da FOLHA: É hoje, Corinthians (foto). Do cardeal paulistano e corintiano Paulo Evaristo Arns, no caderno especial do jornal: a final seria a conquista de "um povo sem vitórias na vida e que busca no futebol a própria taxa da existência". Zé Duarte tenta esconder o time da Ponte. Mas será o da derrota por 1 a 0. Corinthians ainda não se sabe. Basílio jogou bem. Vaguinho talvez não volte à equipe na ponta-direita. E quase não volta ao clube. Brigou feio com Brandão quando soube que não jogaria a segunda decisiva. "Sou o atleta há mais tempo no clube além de Zé Maria e não vou nem aparecer na foto da final"? . Brandão fez a média. Disse a Vaguinho que ele faria o gol do título no segundo jogo. Gol, ele fez. Mas ainda não era a hora. Ainda não eram os 36min43s de 13 de outubro de 1977. 

09/10/1977. "Um grande espetáculo, uma decisão adiada", foi a manchete mais neutra que água de salsicha da FOLHA para a espetacular virada da Ponte Preta, assistida pelo maior público da história da capital. Mais de 136 mil pagantes e quase 150 mil presentes para Corinthians 1 x 2 Ponte Preta, segundo jogo decisivo do Paulista de 1977. Vaguinho abriu a contagem aos 43, 10 depois da saída do lesionado Palhinha (craque da equipe de Brandão). Dicá empatou em bela cobrança de falta, aos 23, em infração discutível sofrida no primeiro lance de Parraga. Rui Rey virou, aos 41 minutos. Adãozinho foi expulso no final do jogo. Zé Eduardo foi suspenso pelo acúmulo de amarelos. Palhinha não deve jogar a terceira decisiva no Morumbi, na quinta, por conta do estiramento muscular. Mas Tobias deve voltar à meta. O lateral Odirlei também não joga pela Ponte, pelo terceiro amarelo recebido em boa arbitragem de Romualdo. Sete pessoas se feriram antes do jogo com a explosão de um barraco cheio de balões de gás. O incidente também interferiu no desempenho das equipes, principalmente do Corinthians, embalado e perdido pelo clima de "já-ganhou", mesmo depois de 22 anos sem títulos. Muita festa no gramado antes de a bola rolar. Torcedora-símbolo Elisa por lá, quase toda a imprensa garantindo que o título já estava definido (eu, com 11 anos, também achava). E ainda maior a euforia corintiana depois da vantagem no primeiro tempo, que definiria o título sem precisar do terceiro jogo. "No intervalo, depois do meu gol, um monte de cartola e conselheiro invadiu o vestiário já comemorando o título. O Brandão nem conseguiu falar direito com a gente. Não podia dar certo desse jeito", conta Vaguinho. E não deu. A Ponte foi mais time (e era) e virou, na maior vitória da história do clube. 

Veja a narração de Luiz Noriega dos gols

(Os dias 10, 11, 12 e 13 de outubro de 1977 ficam para outro post). 

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Sobre o Autor

Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério

Sobre o Blog

O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.

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