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Ronaldinho Gaúcho brincava, ele não jogava

Mauro Beting

17/01/2018 13h24

Se pudesse, em vez de cantar para um estádio lotado as músicas que a plateia já ouviu mais do que o próprio autor, ele seguiria tocando a guitarra dele com amigos na garagem de casa.

Não é estereótipo. É caso típico na música. Ele não nasceu para ser rockstar. Ele só quer rock. Não quer estrela, exposição e histeria.

Artista de cinema tem ego de jornalista esportivo. Quer mesmo que a vida seja o espelho pedindo autógrafo. Ainda que ele recuse tirar uma selfie com o papa – a não ser que o assessor conte e leve pra conta os cliques midiáticos.

Mas também tem artista que prefere o aplauso de 200 pessoas a cada noite no teatro. Ou nem isso. Esconde-se atrás da máscara ou da personagem. Até mesmo cria uma carapuça para que possa viver a vida dele. Não a dos castelos de Caras ou capas de revista ou moments do Twitter ou memes de internet.

Tem quem quer ser reconhecido mas não conhecido. Fica feliz por fazer, não pelo que se faz com sua obra.

Não é frescura. É. E nem sei mais se posso usar o termo "frescura". Mundo complicado.

No momento de texto de auto-atrapalha, penso nisso tudo quando lembro Ronaldinho. Nosso André Rocha, em seu blog no UOL, abordou a figura também por aí.

Talvez, a partir de 2006, como escrevi no texto anterior, Ronaldinho Gaúcho só tentou ser mais "feliz" do que craque decisivo. Mais ou menos como Romário, que não queria ser gênio (e foi), mas apenas goleador (e como foi). "Não sou atleta, sou centroavante. Não quero jogar bem, quero fazer gols".

E foi dos mais felizes e dos que mais nos fizeram felizes em todos os campos.

Talvez Ronaldinho tenha sido isso a partir de 2006. Ou só isso. Não queria perder a própria felicidade dentro e sobretudo fora de campo. Mas nos deixou meio que com o sorriso amarelo. A alegria engasgada. A esperança enganada.

Com os anos pesando e passando, novos craques maiores do que ele o ultrapassando em talento e números (Messi e Cristiano são melhores e maiores, e o argentino é ainda mais genial e muito mais objetivo também por isso que R10), Ronaldinho foi largando o que oficialmente anunciou agora. Embora o mundo já soubesse há quase dois anos. Com pesar. Muito pesado.

Talvez ele não quisesse mais um Santiago Bernabéu o aplaudindo como em 2005. Até a torcida contra torcendo a favor do talento puro e da alegria escancarada como zaga rival. Talvez ele não quisesse nem mesmo o Camp Nou todo dele. Queria só aquele campinho de várzea para brincar. Aquela pelada sem regras e nem compromissos. Ele só queria mesmo era brincar. Não jogar futebol ou ganhar campeonatos.

Tenho certeza absoluta que ele sempre foi o cara que deve chegar numa roda de gente jogando bola e se oferecer:

⁃Posso brincar com vocês?

Deve, Ronaldinho. Você brinca demais.

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Sobre o Autor

Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério

Sobre o Blog

O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.

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