Brasil 3 x 3 Itália. Copa de 1982. Sai pra lá, Sarriá!
43min20s em Sarriá. Oscar subiu no segundo pau e testou com a violência e competência de costume a falta cruzada por Éder. Do alto de seus 40 anos e 5 meses, o melhor goleiro da velha escola que vi – Dino Zoff – fez a mais impressionante defesa sem rebote que já vi. Mas, mesmo com a bola sobre a linha, o árbitro israelense Abraham Klein errou. De novo. Deu o gol de empate para o Brasil de Telê contra a Itália de Enzo Bearzot.
O 3 a 3 polêmico em Barcelona classificou para a semifinal a melhor Seleção da Copa de 1982. Como disse o ótimo armador italiano Marco Tardelli, "Se Brasil e Itália jogassem 20 vezes, eles ganhariam 19 partidas. Mas não nos venceriam em 5 de julho de 1982". E não ganhamos. Empatamos com o gol de Oscar depois de uma das maiores partidas da história do futebol. "O Brasil parece mesmo a Holanda de 1974, pelo conjunto e movimentação", disse o treinador italiano Bearzot. Telê dizia na véspera da partida: "Parecemos a Holanda pelos deslocamentos. Mas temos mais criatividade, malícia e o toque perfeito".
A crônica desatenção na marcação pelo lado direito nos prejudicou de novo. O excelente lateral-esquerdo Cabrini avançou sozinho e cruzou para Paolo Rossi acertar seu primeiro lance em 5 jogos da Copa. 1 a 0 Itália, aos 4 minutos. Serginho Chulapa atrapalhou Zico aos 10, e o Brasil perdeu a chance do empate que viria um minuto depois, com Sócrates, em jogada brilhante do Galinho.
Gentile, marcador individual de Zico, recebeu amarelo um minuto depois. O nada gentil zagueiro cometeu quatro faltas – e mais duas não marcadas pela atrapalhada arbitragem. O Brasil empatou e seguiu atrás do gol da virada. Mas marcando mais firme e forte. Bearzot disse ter visto uma certa insolência brasileira depois do primeiro empate. "Eles achavam que venceriam a qualquer momento". Não vi. O Brasil estava marcando melhor a Itália que enfim jogava bem na Copa.
Aos 24 minutos, Cerezo virou sem olhar a bola para a zaga. Luisinho já havia se mandado – como era praxe. A pelota ficou entre Falcão e Júnior. Rossi apareceu entre eles e mandou de fora da área. Ele era um baita artilheiro que tinha sido suspenso por dois anos e jogara mal quatro jogos. Não fazia gols de cabeça e nem de fora da área. Fez os dois assim. 2 a 1 Itália.
O Brasil enfim sentiu. E a arbitragem errou pela primeira vez. Gentile rasgou a camisa de Zico dentro da área. Árbitro preferiu marcar primeiro bolada na mão do 10 brasileiro em vez de marcar o pênalti claro.
Juizão compensaria aos 9 do segundo tempo, não marcando um pênalti de Luisinho em Rossi. E os deuses da bola fariam tudo mais lindo e justo aos 22, com o golaço de canhota de Falcão, em grande arrancada de Cerezo pela direita, desmontando o 1-4-2-3 da zona mista de Bearzot.
Sem o lesionado volante Batista, Telê "fechou" o Brasil ao seu estilo. Sacou Chulapa, colocou Sócrates como centroavante, e escalou Paulo Isidoro para seguir o lateral Cabrini, mantendo o inovador 4-2-3-1 inspirado no Palmeiras de 1979, e elevado à enésima potência e qualidade no Flamengo de 1981-82.
O Brasil ficou mais com a bola. Não tentou virar o placar, embora tenha criado duas ótimas chances até um recuo tolo de Cerezo dar em escanteio. Conti bateu, Oscar tirou de cabeça, Tardelli mandou de novo pra área, Júnior deu condição de jogo, e Rossi marcou o terceiro, em nova bobeada individual de um craque.
Eram 29 minutos. Entramos em parafuso. Fomos de qualquer jeito ao ataque. Antognoni só não ampliou aos 42 por impedimento muito mal marcado, anulando a finalização certa do meia italiano, em grande e perigosa arrancada do líbero italiano Scirea.
Para que dar o contragolpe aos brasileiros como fez Scirea? Os italianos também pareciam não saber administrar a vantagem.
Foram castigados no minuto seguinte. Éder cruzou, Oscar cabeceou, gol. 3 a 3. O Brasil teve teve 10 chances contra seis italianas. Sempre atrás no placar, buscamos na raça e na vontade a classificação.
Os italianos foram gigantes. Tivesse Paolo Rossi jogado mais nas partidas anteriores, especialmente no 2 a 1 contra a Argentina, talvez eles tivessem feito daquele 5 de julho de 1982 uma tragédia como foi o Maracanazo de 1950, a de Berna em 1954 para a Hungria, a de Munique em 1974 para a Holanda. O futebol teria perdido muito com a derrota do Brasil.
Em vez do futebol mais ofensivo e vistoso, talvez tivéssemos visto uma praga pragmática que teria entrevado e estragado o nosso jogo dos anos 80 até a conquista do penta, em 1994. Quando o Brasil foi campeão pelo talento de Romário e também pela bem organizada equipe de Parreira. Um time não tão brilhante como o de 1982. Mas ainda muito bom e fluido, leve, sem tantas amarras táticas. A vitória em 1982 mostrou que é possível jogar bem e ser vencedor. Como também seria o hexacampeão em 2002. Nem tanto em 1994. Mas com o espírito e o jogo mais leves pelo caneco e pelo legado de 1982.
Não só o Brasil ganhou a Copa na Espanha. Ele conquistou o mundo. E um lugar na história. Não foi mais time que o Brasil de 1970 e 1958. Mas ainda o time de Telê em 1982 é um dos maiores campeões da história. Ainda que não tão equilibrado defensivamente, era equipe que dava gosto e orgulho de torcer.
Tanto fez escola que arrisco a dizer que, mesmo se tivesse perdido a Copa em 1982, ainda assim seria enaltecida 35 anos depois depois da melhor partida daquela que foi a melhor Copa que vi.
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