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Blog do Mauro Beting

Torça pra quem quiser, menos para quem é fiscal de torcida

Mauro Beting

29/06/2018 11h15

Eu sou brasileiro há 51 anos porque há 156 meus avós prussianos tiveram de ser brasileiros para poderem comer. Eu também sou brasileiro com muito orgulho porque meus tios-bisavós italianos vieram cuidar dos órfãos de imigrantes e de ex-escravos em São Paulo, há 120 anos, enquanto o outro lado italiano da família da minha mãe escolheu o Brasil em vez da Austrália para ganhar o que a Itália vinha perdendo de gente e riqueza.

Sou brasileiro com muito amor porque alemães e italianos vieram ao país e aqui se conheceram e casaram. Aqui fizeram família e casa. Sou tão brasileiro quanto italiano e alemão.

Torço pelo Brasil mais do que pela Azzurra e pela Nationalmannschaft. Chorei com Sarriá em 1982 e vibrei com Rose Bowl em 1994. Comemorei a final de 2002 como caí de sete em 2014. Mas gritei mais no gol de Kross na Suécia que no de Coutinho na Costa Rica.

É torcida. É Copa. É gosto. Como pizza é como Copa. Até quando é ruim é ótima. Qualquer joguinho de Copa é como qualquer pedaço de pizza. É uma delicia. E, como pizza (tirando a portuguesa…), qualquer escolha é aceitável. Ninguém é mais ou menos porque prefere calabaresa a mozzarella. Você pode torcer pelo Messi e pelo Cristiano. Pode vibrar pela Espanha e torcer contra Portugal. Pode querer vitória celeste ou derrota infernal da Argentina. Pode virar Islândia ou uma ilha torcendo pelos hermanos.

Torcer é escolha individual mais coletiva que existe. E toda ela se justifica, não se justiça. Ninguém pode ser cobrado por torcer ou por não torcer. Não é modinha ou nutella ou raiz ou berço. É gosto. Também desgosto. Milha filhota torce pelo Uruguai porque acha o Muslera um gato (?!). Uma tia torce pela Rússia pelo passado comunista. Um amigo é Colômbia pelo Mina e até pelo Borja. Um colega é Peru pelo Trauco e até pelo Guerrero. Outro é contra o Peru pelo Guerrero que o deixou e pelo Cueva que é do outro. Outro ainda e contra o Peru desde 1978 na Argentina. Outro é Messi mas é contra Argentina pelo mesmo motivo.

Eu sou sempre Brasil porque é berço. Sou sempre Itália e Alemanha depois do meu país pela raiz dos meus pais. Sou Holanda quando dá desde 1974. E troco de camisas como quem troca de camisa quando alguns times que representam alguns países trocam a bola com categoria. Como a França muitas vezes. A Hungria de 1954. E algumas equipes que torço independente da camisa.

Torcer é assim. Não exige razão. Só não tem a menor razão quem exige coerência ou motivo para torcer. Quem cobra quem torce por um país, uma equipe, um clube, um craque, um gato, uma biografia. Também não pode exigir que se torço por um continente, um regime, uma economia, uma ideia ou se torça contra um político, um povo, um rival.

Futebol é plural. Torcida é emoção. Quem exige razão não tem juízo. É mais arbitrário que árbitro de vídeo que não VAR e racha.

Sobre o Autor

Mauro Beting é comentarista do Esporte Interativo e da rádio Jovem Pan, blogueiro do UOL, comentarista do videogame PES desde 2010. Escreveu 17 livros, e dirigiu três documentários para cinema e TV. Curador do Museu da Seleção Brasileira, um dos curadores do Museu Pelé. Trabalhou nos jornais Folha da Tarde, Agora S.Paulo e Lance!, nas rádios Gazeta, Trianon e Bandeirantes, nas TVs Gazeta, Sportv, Band, PSN, Cultura, Record, Bandsports, Foxsports, nos portais PSN, Americaonline e Yahoo!, e colaborou nas revistas Placar, Trivela e Fut! Lance. Está na imprensa esportiva há 28 anos por ser torcedor há 52. Torce por um jornalismo sério, mas corneta o jornalista que se leva muito a sério

Sobre o Blog

O blog fala, vê, ouve, conta, canta, comenta, corneta, critica, sorri, chora, come, bebe, sofre, sua e vive o nosso futebol. Quem vive de passado é quem tem história para contar. Ele tem a pretensão de dar reload no que ouvi e li e vi e fazer a tabelinha entre passado e presente para dar um toque no futuro.

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